terça-feira, 7 de outubro de 2008

Turnê Noites de gala, samba na rua - Edição RIO DE JANEIRO

Tempo da delicadeza!

Por Fabiano Gonçalves


Quando um dos maiores compositores do país encontra um conjunto de intérpretes virtuosos, o resultado só poderia ser um show inesquecível. Dezenas de artistas brasileiros já mergulharam no rico universo das composições de Chico Buarque, um dos pilares da música popular brasileira. Naufragar completamente é difícil, haja vista a excelência das canções buarqueanas, mas poucos alcançam o brilhantismo das gravações de Maria Bethânia, por exemplo. Na noite do dia 9 de setembro, o público que lotou o Teatro Carlos Gomes, no centro do Rio de Janeiro, pôde constatar a ascensão de mais um grupo de intérpretes ao panteão dos grandes artistas da MPB. A cantora paulistana Mônica Salmaso, na (excelente) companhia do Grupo Pau Brasil, apresentou o show do CD Noites de gala, samba na rua, todo dedicado à obra de Chico Buarque. A apresentação foi parte de uma turnê nacional patrocinada por um banco brasileiro. A cantora, jornalista por formação, contava histórias, recheadas de informação e humor. Após mergulhar na discografia de Chico para a compilação das canções do CD, a cantora fez uma lista com 80 músicas. “Depois só consegui chegar a 60 e vi que não conseguiria reduzir mais. Tive que passar a bola”, declarou. Catorze canções foram gravadas. Mais que isso: foram revitalizadas, reinventadas, renovadas. O balanço jazzístico do Grupo Pau Brasil – formado em 1979 e com oito CDs na bagagem (Babel, de 1996, foi indicado ao Grammy de melhor grupo de jazz) – deu novos ares à Quem te viu, quem te vê (de cujos versos foi retirado o título do álbum) e já arrebatou a platéia com arroubos de criatividade e técnica – qualidades presentes em todas as interpretações da noite. O brilho na roupa da cantora era pequeno se comparado ao brilho de seus olhos e sua voz na canção que se seguiu: Você você, parceria de Chico com Guinga já da década de 1990. A alegria dava o tom do espetáculo. Era visível a felicidade dos artistas no palco, que brincavam como crianças com seus instrumentos. Prova disso foi a delicada interpretação de Ciranda da bailarina, composta por Chico e Edu Lobo para O grande circo místico. Não faltaram em cena nem bolinhas de sabão. Já a conhecida Construção ganhou ares contemporâneos e foi desconstruída rítmica e melodicamente, numa brilhante performance. Colaborou para isso a bela iluminação (não creditada no programa). Todas as qualidades das composições de Chico Buarque ganharam brilho e cores novas com o talento dos músicos – além de Mônica, Nelson Ayres (piano), Paulo Bellinati (violão e cavaquinho), Rodolfo Stroeter (baixo), Teco Cardoso (sax e flauta) e Ricardo Mosca (bateria e percussão). Na bela Morena dos olhos d"água, a voz, acompanhada por uma guitarra acústica, sublinhou toda a riqueza da melodia. O suingue de Partido alto ganhou destaque com o ênfase dado ao ritmo existente na própria letra. E o arranjo de Flor da idade (de Paulo Bellinati, na maioria) dispôs voz e instrumentos até quase transformar a canção em uma orquestra de cordas. E em Beatriz, a voz e o piano flutuavam do chão ao céu com uma suavidade etérea de tirar o fôlego. Fugindo um pouco do cancioneiro buarqueano, foram apresentadas duas composições do próprio Grupo Pau Brasil. Pulo do gato, de Paulo Bellinati, foi uma sucessão de arroubos criativos nos solos. Encerrando a brilhante apresentação, Moda, do Pau Brasil, deliciosa canção em estilo moda de viola do interior paulista, cuja criativa letra faz as apresentações dos artistas. Se, no futuro, escafandristas vierem explorar sua casa, que encontrem e se deliciem com a música de Mônica Salmaso e do Grupo Pau Brasil. E, assim, percebam o amor que, um dia, esses talentosos artistas deixaram para nós. Nota do editor: Não é costumeiro este tipo de comentário que não se restringe exclusivamente à música dita clássica. Abrimos esta excessão e outras poderão vir. Afinal, Chico Buarque é ou não é um clássico?

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